André Barrocal e Maria Inês Nassif
BRSÍLIA – Com a grande maioria do partido unida e sem grandes divergências, o IV Congresso Nacional do PT deve ter como único ponto de debate mais acaladorado uma questão formal sobre o estatuto que reflete, na verdade, uma dúvida hamletiana. Depois quase nove anos na Presidência da República, o PT quer ser um partido de massas como hoje, com 1,4 milhão de filiados, ou voltar a ser mais politizado e ligado a movimentos sociais, como em suas origens, 31 anos atrás?
No centro da discussão, está uma proposta de mudar as regras de filiação e de participação nas eleições internas do partido. Tem sido defendida pelo ex-presidente do PT Ricardo Berzoini. O deputado federal pertence à maior corrente do partido, Construindo um Novo Brasil (CNB), mas não tem apoio dela, que abriga os principais nomes do PT, como o ex-presidente Lula e o ex-ministro José Dirceu. Mas conta com a simpatia da segunda maior tendência, a Mensagem ao Partido.
De acordo com Berzoini, na terça-feira (30/08), uma comissão de 15 petistas criada para rever o estatuto fechou uma proposta. O interessado em filiar-se teria de fazer primeiro um curso sobre a história e o programa do PT. Só seria aceito depois. Também teria de pagar contribuição semestral (hoje é anual) e estar em dia pelo menos até 90 dias antes de uma eleição interna. O objetivo é evitar filiações em massa às vésperas de eleições. “Precisamos acabar com a lógica da filiação com objetivo determinado”, diz Berzoini.
“Uma grande restrição à atuação dos filiados vai acabar transformando os movimentos sociais em massa de manobra do PT”, rebate o deputado federal Jilmar Tatto (SP).
Os dois líderes do PT no Congresso estão em lados diferentes. Para o líder na Câmara, Paulo Teixeira (SP), que é da Mensagem ao Partido, a mudança estatutária daria uma oportunidade para algo que ele considera fundamental. Depois de oito anos de governo Lula, o PT tem de se atualizar e se oxigenar. “Precisamos atrair os jovens e [os militantes políticos que usam] as novas mídias”, afirma Teixeira.
Já o líder no Senado, Humberto Costa (PE), que é da CNB, discorda de alteração nas regras. “Não sou a favor de uma mudança radical. Já temos experiências anteriores de curso de formação que não deram certo. O PT tem preferência de 32% do eleitorado e deve continuar sendo um partido de massas”, diz.
A CNB discutiu o assunto nesta quarta-feira (01/09), em São Paulo, mas, por ora, ninguém arrisca um palpite sobre o que vai acontecer no IV Congresso. “Há uma uma polarização importante, mas acredito que vai sair uma posição intermediária, negociada, como é tradição no PT”, diz o presidente o partido no estado de São Paulo, Edinho Silva.
Para os defensores de um certo endurecimento das regras de filiação, a mudanças pode impedir que o partido seja controlado por políticos com acesso a grandes redutos eleitorais e sem formação ideológica, o que trabsformaria o PT num amontoado de interesses regionalizados, como é o PMDB.
O desconforto com a situação atual, de um certa despolitização, será explicitada no Congresso com a apresentação de uma proposta de criação de uma nova corrente, a “Inaugurar um Novo Período”. Constituída de uma dissidência do grupo Articulação de Esquerda, está entre os grupos minoritários mais à esquerda.
Os dissidentes acham que o PT se afastou demais dos movimentos sociais no governo Lula e, hoje, não discute mais política internamente. O partido teria deixado de “encantar” os eleitores e de “debater sonhos”. “A esquerda, quando ganha a eleição, se institucionaliza, os quadros vão para o governo e se afastam dos movimentos sociais. Queremos reavaliar isso”, afirma Altemir Gregolin, ex-ministro da Pesca com Lula.
Ex-presidente do PT e atual assessor especial no ministério da Defesa, José Genoino, que é ligado às correntes dominantes do partido, tem avaliação semelhante. “Hoje há um clima de unidade em torno da presidenta Dilma mas não há debate político e ideológico”, diz.
Nenhum comentário:
Postar um comentário